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Há mais de 100 milhões de anos, o planeta Terra vivia um tempo em que vulcões ativos cobriam os campos com rios de lava incandescente. O calor moldava tudo ao redor.
Sobre esse solo instável, caminharam seres gigantescos. Dinossauros cruzavam os campos incandescentes, onde a lava ainda esfriava e os primeiros resquícios de cristalização aconteciam sob seus pés.

 Com o resfriamento da lava, formaram-se camadas de basalto - uma rocha escura e densa. Dentro dela, cavidades ocorriam pela presença de gases presos. E nesses espaços, lentamente, formavam-se os Geodos.

 Durante milhões de anos, os geodos permaneceram ocultos sob o solo. Até que, por acaso, agricultores da região começaram a encontrar sinais de um futuro inesperado e brilhante.

*pausa troca de assunto

 No século XX, famílias moravam onde hoje é Ametista do Sul, com uma vida simples e baseada na agricultura. A roça e a criação de animais sustentavam a comunidade. As estradas eram de chão batido, e os barrancos guardavam algo que logo chamaria atenção.

*pausa depoimento garimpeiro

 O rolado, à primeira vista, não lembrava em nada a ametista lapidada que conhecemos hoje. Tinha o formato semelhante, mas era opaco, coberto por marcas do tempo. Para saber se havia ametista por dentro, só havia um jeito: quebrar.

*pausa depoimento garimpeiro

Além dos rolados, também eram encontradas as corriqueiras, conhecidas hoje como chapinhas: finas e achatadas.

*pausa depoimento

Foi aí que tudo começou. O que no começo era dúvida, foi se tornando descoberta. Foi quando os primeiros 'bicos' apareceram.

*pausa depoimento

Com o passar do tempo, a busca ficou mais técnica. Alguns começaram a usar sondas manuais, ferramentas simples que ajudavam a identificar a presença das pedras sob o solo.

*pausa depoimento

 As pedras encontradas nas lavouras logo deixaram de ser apenas curiosidade. Algumas pessoas vendiam para garantir o básico. Outras trocavam até por animais. A ametista virou moeda.

*pausa depoimento

Durante anos, tudo foi feito com a força do braço. Era na enxada e no picão, no meio da lavoura ou nos barrancos. Esses barrancos de rocha mais macia ficaram conhecidos como tijolo, e era ali que, com sorte, se encontravam geodos inteiros. Essa rocha, que ainda podia ser removida com pá e picão, passou a ser alvo dos primeiros tratores que chegavam - facilitando a escavação entre as paredes e acelerando um trabalho que antes levava dias.

*pausa depoimento

 Foi José Salles quem deu o pontapé inicial. Trouxe o trator, abriu as primeiras rampas e mostrou um novo jeito de trabalhar a terra. A partir dali, com a agilidade que a máquina proporcionava, outros

tratores começaram a surgir.

*pausa depoimento

Os tratores avançavam até onde podiam. Quando removiam o tijolo - aquela rocha mais macia e alcançavam o basalto, muitos consideravam o trabalho encerrado. Mas outros persistiam.

*pausa depoimento

 Era ali, na rocha firme, que um novo tipo de esforço começava. E com ele, nascia oficialmente as brocas.

*pausa troca de tema

 Os mesmos tratores que antes eram usados para remover o tijolo mole passaram a ter uma nova função: abrir rampas. Era por essas entradas inclinadas que se acessavam as frentes de trabalho,

facilitando o transporte do material e marcando o início de uma nova etapa.

*pausa depoimento

 Com as rampas finalizadas, até a rocha, sem máquinas e sem proteção, era o picão, a marreta e a talhadeira quem abriam caminho na rocha.

*pausa depoimento

 As ferramentas precisavam durar. A talhadeira - usada para abrir os primeiros furos na rocha -era forjada com o que se tinha à disposição. Mas não podia ser qualquer ferro. Para aguentar o impacto

diário contra o basalto, era preciso algo resistente, que não quebrasse fácil.

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A solução veio da própria estrada: usavam molas de caminhão. Aço temperado, reciclado, transformado à marreta e fogo. Era esse o material escolhido para dar origem às talhadeiras que abriram

os primeiros caminhos dentro da terra.

*pausa depoimento

 Com o avanço do tempo, uma nova tecnologia começou a se espalhar entre os garimpeiros: o martelo pneumático. Alimentado por um compressor a gasolina, ele substituiu a marreta e a talhadeira

no trabalho pesado de perfuração. Onde antes se levava minutos - ou até horas - para abrir um furo na rocha, agora bastavam minutos.

*pausa depoimento

 O esforço seguia intenso, mas a eficiência mudava tudo. O martelo pneumático abriu caminhos mais fundos, permitiu alcançar novos níveis do basalto.

*pausa depoimento

 Quando a profundidade exigia mais do que o corpo podia alcançar, o basalto já não cedia com facilidade. Foi aí que vieram as detonações.

*pausa troca de tema

 No início, usava-se pólvora industrializada. Mas ela tinha dois grandes problemas: o custo alto e apotência. A explosão era tão forte que muitas vezes estilhaçava os geodos, quebrando as pedras antes

mesmo que fossem retiradas.

*pausa depoimento

Foi então que, por necessidade e engenhosidade, nasceu uma solução improvisada: a pólvora negra. Produzida artesanalmente, com salitre, carvão moído e enxofre, ela permitia um controle maior

da explosão - suficiente para abrir a rocha sem destruir o cristal.

*pausa depoimento

Com a pólvora preparada, vinha o ritual da detonação. Cada explosão exigia precisão e cuidado. Os furos eram feitos com talhadeira ou, mais tarde, com o martelo pneumático.

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O perigo era constante. Se a pólvora estivesse úmida, demorava mais para detonar - um atraso que podia custar a vida de um garimpeiro. A instabilidade nas explosões, as falhas nos tiros, e a falta de

proteção transformavam cada detonação em um momento de tensão. Muitos se feriram. Alguns nunca voltaram.

 Anos depois, Enio Potrick ainda guarda em casa o testemunho de tudo aquilo. Uma pedra inteira, retirada da rocha com precisão e paciência. A pedra, hoje no quintal, carrega as marcas da broca, da

talhadeira, da explosão medida no tempo certo. E mais do que isso: carrega a história viva de quem a tirou de lá de dentro.

*pausa troca de tema 

As detonações deixavam para trás montes de rejeito. Pedaços de pedra, barro e poeira tomavam conta do caminho. Tudo precisava ser carregado para fora, no braço, em baldes, carrinhos ou com a

ajuda dos primeiros trolles. O trabalho não terminava com a explosão - ele apenas recomeçava.

*pausa depoimento

 Enquanto os braços empurravam carrinhos nos trilhos improvisados dos primeiros trolles, algo mais começava a se mover - dessa vez, fora das minas.

*pausa troca de tema

Enquanto o trabalho nas brocas ganhava ritmo e as ferramentas evoluíam, um novo sentimento começava a tomar forma entre os moradores: pertencimento. O lugar onde antes se conhecia apenas

como distrito de Planalto começava a mostrar identidade própria - com economia forte, cultura surgindo e gente que já falava com orgulho da terra da pedra ametista.

Foi em meio a esse despertar que nasceu a ideia de emancipação. Em reuniões comunitárias,

surgiram propostas de nomes: Alto São Gabriel, São Gabriel do Cristal, Alto do Cristal. Mas foi Antônio da Rocha quem lançou um nome simples e definitivo: Ametista do Sul.

*pausa depoimento

O nome veio da pedra, da história e de uma inspiração inesperada: uma novela e uma rádio quecarregavam a mesma palavra. Ametista. Era simbólico, sonoro, e refletia tudo que aquele chão já

representava para quem vivia ali.

 Com o nome definido e o município oficialmente emancipado, Ametista do Sul entrava em uma nova fase. Mas o progresso tinha seu preço. À medida que a cidade ganhava forma na superfície,

debaixo da terra, os túneis desciam cada vez mais fundo. Mas havia também algo que ninguém via que ninguém entendia - e que só seria reconhecido com o tempo.

*pausa troca de tema

 Com as explosões, as galerias foram se aprofundando. Surgiam as furnas - túneis escavados cada vez mais para dentro, metros abaixo da terra. Mas encontrar ametistas não era simples: era preciso

perfurar o basalto em pontos estratégicos, na esperança de cruzar com a lavra de geodo escondido.

 No início das perfurações, eram feitas a seco. Sem água, o pó tomava conta do ambiente, ele se espalhava pelas brocas e entrava fundo nos pulmões. Os primeiros sintomas eram ignorados: uma tosse seca, o cansaço vindo mais cedo, a dificuldade em respirar depois de um dia inteiro de trabalho.

*pausa depoimento

 Muitos achavam que era só poeira, que com o tempo passava. Mas não passava. O corpo ia cedendo em silêncio. Foi então que Ivonir Potrick lembrou de uma solução simples, usada ainda no

tempo de seu pai:

*pausa depoimento

 A perfuração a úmido substituiu a seca. Menos poeira. Mais segurança. Mais vida!

Desta grande mobilização, que uniu esforço e pessoas, surgia a Amparo, associação criada para mobilizar forças na proteção e apoio aos garimpeiros.

*pausa toca de tema

Criada por Enio da Rosa, após sugestões de professores da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e a AMPARO passou a lutar por tratamentos, exames, suporte jurídico e conscientização. Um movimento criado por quem sentiu na pele os efeitos da poeira e da desinformação. A missão era clara: evitar que a história continuasse se repetindo.

*pausa depoimento

 Em paralelo, os garimpeiros começaram a se organizar também como categoria. Nascia a COOGAMAI - Cooperativa dos Garimpeiros de Ametista do Sul - marcando um novo tempo para o setor.

A informalidade deu lugar à união. As decisões passaram a ser coletivas. Os direitos começaram aser respeitados. A partir dali o garimpo passou a operar com normas técnicas, controle mais rígido e

segurança no centro das atenções.

O uso de equipamentos de proteção passou a ser obrigatório. Capacetes, máscaras e uniformesdeixaram de ser exceção e passaram a fazer parte da rotina diária de trabalho. As explosões, que antes

eram feitas de forma improvisada, agora só podiam ser realizadas por profissionais certificados - os chamados blasters.

 A COOGAMAI também ajudou na regularização dos garimpos, oferecendo estrutura jurídica, acesso a crédito e apoio nas exportações. Era um novo capítulo para os que sempre trabalharam com as

mãos, mas agora tinham também voz, organização e segurança.

*pausa troca de tema

 O garimpo se tornou mais eficiente. Como consequência, veio o crescimento e novas oportunidades foram surgindo no horizonte.

*pausa troca de tema

 Antes que o turismo virasse produto, ele já existia de forma natural. Viajantes que passavam por Ametista do Sul ficavam intrigados com o que se contava sobre a região - e queriam ver de perto onde

tudo acontecia.

 Alguns garimpeiros, como Nerci Dutra, passaram a receber visitantes em suas brocas. Mostravam as galerias, explicavam o processo, abriam as portas de um mundo subterrâneo. Era uma troca de

histórias, sem valor definido. O turismo ainda era curiosidade.

*pausa depoimento

 Enquanto isso, nas galerias de uma antiga área de garimpo, uma nova ideia ganhava forma. Valmor, que preservava um acervo raro de pedras, decidiu que era hora de compartilhar com o público

aquilo que ele sempre guardou com tanto respeito.

 Em 2001, inaugurava o Ametista Parque Museu. Um espaço subterrâneo onde o brilho das pedras encontrou vitrines, corredores e visitantes do mundo inteiro. Pela primeira vez, o turismo deixou de ser

apenas interesse e passou a ser experiência estruturada. Um produto.

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 Com o museu aberto ao público, o movimento cresceu. O turismo deixava de ser algo esporádico e começava a transformar a economia da cidade.

Diante dessa nova realidade, os próprios garimpos passaram a se adaptar. Nerci Dutra, que já abria as portas da broca para os visitantes, organizou os acessos, definiu regras e passou a cobrar um valor simbólico por pessoa - cerca de dois reais. Era o início de uma nova fase: agora, até o subsolo fazia parte da rota oficial do turismo.

*pausa depoimento

O que antes era silêncio, virou explicação. O que era suor, virou aula. E cada visitante saía dali carregando mais do que lembrança - saía com respeito.

 O turismo cresceu. Vieram lojas, restaurantes, parques temáticos e vinícolas. A cidade passou a receber turistas do mundo todo.

 O que antes era sustento virou orgulho. O garimpo fortaleceu o comércio, incentivou novas culturas, deu origem às vinícolas e ajudou a transformar a paisagem, a economia e a história de Ametista

do Sul.

*pausa troca de tema

 Ametista do Sul não é só uma cidade.  É uma cidade que nasceu da pedra, cresceu com ela, e hoje brilha por causa de quem cavou.

 Durante décadas, homens e mulheres desceram à terra com coragem e sem garantias. O suor que escorria em silêncio dentro das brocas se transformou em ruas, escolas, oportunidades. Cada pedra

retirada moldou não só a economia, mas a identidade de um povo.

 O garimpo projetou o desenvolvimento da cidade em novas frentes. Impulsionou o comércio, atraiu turistas, incentivou a criação de vinícolas, restaurantes e pontos culturais. A economia que

começou sob a terra floresceu também sobre ela.

As lutas foram muitas. Enfrentaram a dureza da rocha, os riscos das detonações, a ameaça invisívelda poeira. Mas também souberam se unir, criar soluções, proteger uns aos outros. A Amparo e a

Coogamai nasceram desse instinto de cuidado e coletividade.

 Hoje, o que era sustento virou orgulho. O garimpo impulsionou o turismo, fortaleceu o comércio, e até deu origem a novos negócios que desenham novas paisagens ao redor da cidade. O subsolo já não guarda apenas pedras - guarda histórias, memórias e um respeito que atravessa gerações.

Os antigos garimpeiros deixaram mais do que túneis. Deixaram valores. Persistência, humildade, companheirismo. Deixaram exemplos que hoje são repassados em casa, nas escolas, nos corredores dos museus, nos passeios dos turistas.

E se a pedra é o símbolo da cidade, são os garimpeiros a sua alma. Eles enfrentaram o desconhecido, persistiram onde muitos parariam, e fizeram daquilo que encontraram um legado. O brilho da ametista é, na verdade, o reflexo do esforço de cada um deles.

*pausa depoimento

 Do fogo dos vulcões ao brilho dos geodos. Do silêncio das brocas ao encantamento dos visitantes. De um passado difícil a um futuro promissor. Essa é a história de Ametista do Sul. Uma cidade que, mais do que ter pedra, tem raízes profundas no esforço, na fé e na coragem de seu povo.

voz sem sotaque e identificar e aplicar diferentes tom de emoções




14/07/2025 15:33:57: Pedido realizado - Aguardando pagamento (Locutor: LEANDRO CRUZ)